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São Paulo - O “Seminário Internacional sobre Avaliação da Qualidade da Atenção em Saúde de Populações Vulneráveis: Pessoas com transtorno mental, usuários de álcool e outras drogas e população negra" proporcionou momentos de reflexão dos (as) presentes durante a abertura, as conferências e as mesas de discussão realizadas na quinta-feira (12), primeiro dia de evento. A atividade que seguiu até a sexta-feira (13), na Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista, teve como principal objetivo estimular a produção de conhecimento e estimula os grupos de pesquisa para que possam realizar debates públicos sobre o tema.

A Dra. Maria Amélia de Campos Oliveira, Diretora da Escola de Enfermagem da USP, destacou a intensão do seminário em discutir a saúde mental considerando a perspectiva racial, na medida em que temas tão importantes e fundamentais quanto, como gênero e geração, já estão sendo incorporados nas pesquisas. Além de ressaltar a “originalidade na proposta”, enfatizou que a atividade ocorre no âmbito da Mobilização Nacional Pró-Saúde da População Negra e da Década Internacional de Afrodescendentes (2015 – 2024).

Elisa Lucas Rodrigues, coordenadora de políticas públicas para a população negra e indígena da Casa Civil, saudou a Década Afro e o Mês da Consciência Negra e colocou a atividade como um “marco para a saúde pública paulista, na implementação de uma política diferenciada considerando a diversidade étnica e racial”. A gestora destacou que “pensar em saúde é pensar em equidade, acesso a serviços e diminuição das desigualdades”. Segundo Elisa uma noção necessária para ser difundida por todos e todas gestores (as) do estado de São Paulo.

Para Margareth Angelo, do Departamento de Enfermagem Materno Infantil Psiquiátrico, o espaço é “único para disseminação de conhecimentos e partilha de saberes”. “Que o evento faça emergir novas forças para o desenvolvimento de trabalhos e pesquisas”. E enfatizou completando que isso poderá contribuir para um ambiente acadêmico mais fértil e de parceria entre todos os envolvidos.

Sônia Barros, professora titular da Escola de Enfermagem e presidente do evento, contou o motivo da realização da atividade. Ela destacou que os grupos de pesquisas ao longo dos anos têm realizado pesquisas no âmbito da saúde mental na perspectiva da reforma psiquiátrica “com o rigor necessário e com paixão”, mas que é preciso “avaliar os serviços de saúde mental em diversas dimensões”. “Enfrentamos dificuldades em divulgar avanços e cumprir deveres acadêmicos e sociais de produtores de conhecimento sobre o tema”, disse ao ser referir a temática racial.

A professora ainda compartilhou a informação de que o censo dos hospitais psiquiátricos de São Paulo, realizado em 2008 revelou, entre outros resultados, que existem mais pretos e pardos residentes nessas instituições de saúde que brancos. “Evidencia-se a necessidade de avaliar a saúde mental a partir de indicadores, investir na formação de recursos humanos, criar factibilidade de indicadores numa perspectiva racial e divulgar o que já foi produzido em avaliação de saúde mental, nacional e internacional”.

Racismo: determinante social das condições de saúde
Fernanda Lopes, Representante Auxiliar do UNFPA, Fundo de População das Nações Unidas, realizou a conferência sobre direitos humanos, vulnerabilidade e saúde da população negra. Dentre os diversos temas explorados pela sanitarista destaca-se as violações dos direitos fundamentais provocadas pelo o racismo e suas suas implicações nas condições de saúde da população. Fernanda ilustra os contextos de vulnerabilidade acirrados na vigencia do racismo, com dados sobre mortes violentas entre mulheres e mortes maternas por causas preveníveis.

“Segundo o Mapa da Violência, lançado na semana passada, em 2013, dentre os homicídios cujas vítimas eram mulheres, aproximadamente 67% das vitimas eram negras. No período de 2003 a 2013 o número de homicídios de mulheres brancas caiu de 1.747 para 1.576, em 2013, ou seja observou-se uma queda de 9,8%.Entre as negras os homicídios aumentaram em 54,2% no mesmo período, passando de 1.864 para 2.875. Se utilizarmos as taxas como medidas, no mesmo período o Mapa nos mostra que entre os homicidios cujas vítimas foram mulheres brancas, houve uma queda de 11,9% (passou de 3,6/100 mil em 2003, para 3,2 em 2013). Para as mulheres negras a taxa de homicidios teve um aumento de 19,5%, passando de 4,5 para 5,4 por 100 mil”.

A mortalidade materna é uma das mais graves violações dos direitos humanos das mulheres, por ser uma tragédia evitável em mais de 90% dos casos. A maioria das mortes maternas ocorre por causas obstétricas diretas, aquelas que ocorrem por complicações obstétricas durante gravidez, parto ou puerpério devido a intervenções, omissões, tratamento incorreto ou a uma cadeia de eventos resultantes de qualquer dessas causas. O alto índice de mortes maternas no país é um indicador das iniquidades em saúde.

“Os óbitos maternos tem cara, cor, idade, endereço! Dos 1.505 óbitos maternos investigados em 2013, 772 aconteceram entre mulheres de 15 e 29 anos, das quais 522 eram pretas e pardas. Estas mulheres morreram prioritariamente por eclampsia e pré-eclampsia, se tivessem tido um cuidado de qualidade no pre-natal e adequada atenção obstetrica de emergencia provavelmente nao teriam vindo a obito. Mortes que poderiam ter sido prevenidas. Situação inaceitável em especial porque 98.7% dos partos no Brasil ocorrem em ambiente hospitalar, e são feitos por profissionais capacitados”. Fernanda concluiu a sua apresentação convidando a platéia a refletir sobre sobre as práticas no cuidado em saúde, os processos de trabalho e sobre os esforços que estão sendo empreendidos para garantir que a saúde seja um direito humano fundamental exercido plenamente por todas as pessoas.
 

Texto de Midiã Santana/UNFPA Brasil