Entre outubro e novembro, seis projetos foram desenvolvidos por organizações que atuam na Sala de Situação
Neste dia 06 de dezembro é celebrado o Dia Nacional de Mobilização dos Homens pelo Fim da Violência Contra as Mulheres. Esta data reafirma que esta é uma agenda coletiva e os homens precisam refletir e agir para que todas as pessoas tenham seus direitos respeitados. O protagonismo e a voz das meninas e mulheres é fundamental e central no tema da prevenção e enfrentamento às práticas nocivas contra meninas e mulheres. Porém, construir pontes e estratégias conjuntas é essencial para pôr fim às violências baseadas em gênero.
No Brasil, de acordo com dados oficiais do Governo Federal, no primeiro semestre de 2022, a central de atendimento (Ligue 180) registrou 31.398 denúncias e 169.676 violações envolvendo a violência doméstica contra as mulheres. Uma pesquisa realizada pela Agência Patrícia Galvão “Redes de apoio e saídas institucionais para mulheres em situação de violência doméstica no Brasil”, constata que metade dos brasileiros conhece alguma mulher que já foi agredida pelo parceiro (atual ou ex).
Para além dos dados em si, estas informações apontam que o enfrentamento à violência contra as mulheres envolve toda a sociedade, homens e mulheres. O documento “Masculinidades, Igualdade de gênero e COVID-19” lançado pelo Fundo de Populações das Nações Unidas em 2021, destaca que é necessário o desenvolvimento de políticas, programas e intervenções voltadas para homens, jovens e meninos para o avanço da saúde, igualdade de gênero, corresponsabilização no cuidado e prevenção da violência.
Neste contexto, em 2022 o UNFPA apoiou iniciativas de organizações da sociedade civil do Norte e Nordeste que atuam na Sala de Situação - Violência Baseada em Gênero - focadas em masculinidades a partir de uma abordagem transformadora das visões de gênero no trabalho com meninos e homens. Os estados de Alagoas, Amazonas, Ceará, Maranhão, Paraíba e Tocantins receberam as iniciativas pilotos implementadas ao longo dos meses de outubro e novembro.
Os projetos tiveram como objetivo principal contribuir para a conscientização, compreensão e análise da participação de meninos e homens nas relações de gênero, sua participação no cuidado e seu envolvimento em atitudes e práticas relacionadas à violência contra meninas e mulheres.
“Você tinha que estar nesta palestra de hoje, por que se você estivesse, terminaria com aquele seu namorado. Elas falaram várias coisas que ele faz com você, e isso não é certo!” (Depoimento de professora sobre alunos conversando após oficina de masculinidades)
Um dos projetos, desenvolvido pelo Instituto Àgatha (SE), discutiu o papel das instituições religiosas no combate à violência contra as mulheres. A atividade realizada no dia 22 de novembro reuniu representantes do poder público e de instituições religiosas em uma roda de conversa que aconteceu no Tribunal de Justiça de Sergipe.
“Nós tivemos a intenção de fomentar, provocar aqui alguns atores do Estado que trabalham no combate à violência, a convidar e a convocar pastores e líderes religiosos para uma roda de conversa, onde pudéssemos trazê-los para perto da temática e também para que eles pudessem sair daquele encontro encorajados, entendendo como funciona a rede de atendimento, como podem acessar essa rede e como eles podem encaminhar e auxiliar essa mulher a buscar ajuda”, ressaltou Valéria Chapman, vice-diretora do Instituto Social Àgatha.
Em São Luís, capital maranhense, a Rede de Mulheres Negras do Maranhão (Remnegra), realizou o projeto “Ciranda dos Meninos”, rodas de conversa com meninos de bairros da periferia da cidade. “Foi extremamente importante no que diz respeito a desenvolver atividades reflexiva e preventivas com meninos de bairros periféricos da periferia, bairros extremamente vulnerabilizados”, disse Maria do Socorro Guterres, que integra a coordenadoria executiva da Remnegra. Segundo ela, as atividades contaram, em sua maioria, com a participação de meninos negros. “O projeto foi extremamente rico, com reflexões sobre os papéis, que historicamente foram estabelecidos na sociedade para meninos e meninas, para homens e mulheres, e de como é que podemos reconstruir, desconstruir esses valores históricos para que nós tenhamos relações mais humanas, mais respeitosas”, pontuou.
Em Palmas, capital do Tocantins, o Ajunta Preta realizou rodas de conversa com adolescentes de escolas públicas. A proposta foi estimular a participação de homens nas discussões sobre gênero e seu envolvimento em atitudes e práticas relacionadas à prevenção da violência contra mulheres e crianças. “Consideramos que foi uma experiência muito positiva para todos nós. O projeto ampliou o nosso olhar, nos possibilitou muitas articulações com outros atores aqui no território. Nós vivenciamos encontros muito potentes e conseguimos nos debruçar sobre essa temática”, avaliou Liana Bacelar, membro do coletivo. Segundo ela, as atividades realizadas foram compreendidas como projeto-piloto para que possam continuar avançando nesse debate em 2023. “Vamos avaliar as atividades e replicar esse projeto no próximo ano”.
Na Paraíba, a Abayomi - Coletiva de Mulheres Negras na Paraíba - além de processos formativos em escolas de duas cidades paraibanas, ainda produziu uma série de podcasts onde reuniu homens pesquisadores e da sociedade civil que trabalham com o tema da desconstrução da masculinidade tóxica.
Segundo Durvalina Rodrigues, Coordenadora da Abayomi, “com a implementação do projeto tivemos mais contato com leituras sobre o tema o que nos levou a um mergulho provocando um outro campo de visão para a compreensão e discussão sobre Masculinidade tóxicas e suas imbricações com a violência doméstica e feminicídio. Ter com o Podcasts diferentes abordagens sobre a temática levando convidados que representaram uma diversidade referente a orientação sexual, identidade de gênero (um heterosexual, um gay e um trans), e campo de atuação.”
A Associação de Mulheres Vitória Régia de Parintins, no Amazonas, e o Movimento Ibiapabano de Mulheres (MIM) do Ceará foram organizações também apoiadas no âmbito da estratégia de desconstrução de masculinidades tóxicas.
Segundo a Chefe de Escritório do UNFPA na Bahia, Michele Dantas “o tema do edital deste ano, da Sala de Situação, foi focado no diálogo com o público masculino porque, para a construção de uma sociedade sem violência, é fundamental a participação dos homens, assim como para avançarmos na igualdade de gênero é preciso a inclusão de todos, homens e mulheres.”
Sala de Situação
Em 2020, o UNFPA, em parceria com representantes da sociedade civil, deu início à Sala de Situação em violência baseada em gênero do Nordeste. A Sala de Situação é uma rede de mobilização virtual que reúne organizações da sociedade civil que trabalham com mulheres e também no combate e prevenção à violência de gênero da região Norte e Nordeste. Atualmente, a Sala de Situação conta com cerca de 40 organizações participantes na iniciativa.