Por Fabiane Guimarães
Há dois anos, Débora Rodrigues fazia estágio em uma agência das Nações Unidas (ONU) em Viena, na Áustria, e não conseguia imaginar onde o destino a levaria. A vontade de trabalhar com direitos humanos foi o que motivou a jovem, então com 29 anos, a se candidatar a uma vaga no Fundo de População das Nações Unidas no Brasil (UNFPA), sem saber muito bem o que esperar. Aprovada no processo seletivo, ela não pensou duas vezes ao pegar sua mala e cruzar o mundo até o extremo norte desse país de distâncias continentais: lotada primeiro em Pacaraima, Roraima, e depois em Manaus, no Amazonas, ela passaria por um processo de transformação total. “Sou outra pessoa. Mas me sinto realizada e acredito no que faço”, resume.
Débora está à frente da equipe de assistência humanitária do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), agência do Sistema ONU para saúde sexual e reprodutiva, em Manaus. Coordenando a resposta do UNFPA junto às pessoas migrantes e refugiadas, com ênfase na promoção da saúde sexual e reprodutiva e na prevenção da violência baseada em gênero, a mineira não imaginou que teria que enfrentar uma emergência dentro da emergência. Com a pandemia, o trabalho de toda a equipe, de seis pessoas, se tornou mais intenso.
Na última sexta-feira, com o colapso do sistema de saúde e a escassez de oxigênio na capital manauara, Débora liderou o time que articulou a pronta e efetiva resposta do UNFPA, apoiando a Secretaria Municipal de Saúde com a entrega de 60 cilindros de oxigênio à maternidade Moura Tapajós.. De acordo com ela, a situação é complexa e o Fundo de População das Nações Unidas estuda também apoio às maternidades estaduais, com quem já estabelece diálogo desde o início do trabalho na região.
“A situação não está resolvida. O que chega de oxigênio não é suficiente para a demanda. Estamos trabalhando por sobrevivência, dia após dia”, conta. “As maternidades contam com muitos bebês prematuros, inclusive com Covid-19, que precisam de oxigenação. Além das mulheres grávidas com Covid e do oxigênio necessário para os procedimentos obstétricos”, relata.
Débora acompanhou pessoalmente a entrega dos 60 cilindros de oxigênio, junto à equipe do Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu) da secretaria. Esperou a chegada dos equipamentos por cinco horas e se certificou de que tudo fosse entregue corretamente. Quando chegou em casa, o cansaço fazia com que suas costas doessem. O sentimento, entretanto, era de dever cumprido -- ao menos por ora.
“Estamos trabalhando em duas frentes. Mobilizando recursos para um apoio mais amplo e com o apoio pontual no fornecimento e reposição de cilindros”, explica, dialogando diretamente com a representação do Fundo de População das Nações Unidas em Brasília.
Débora se define como uma pessoa “corajosa, mas cautelosa”. “Estou sempre de máscara, evito aglomerações e sou muito cuidadosa no trabalho em campo”, conta. A coordenadora do escritório rechaça qualquer tentativa de ser definida como heroína, mesmo agora. “As pessoas acham que nós, trabalhadores do humanitário, somos heróis, e é muito fácil embarcar nessa narrativa. Mas eu procuro o caminho inverso”, explica.
“Sou parte de uma engrenagem maior e tenho orgulho do meu trabalho. Mas sou apenas humana”, avisa.
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O Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), agência do Sistema ONU para saúde sexual e reprodutiva, adquiriu na noite da última sexta-feira (15), 60 cilindros de oxigênio, em resposta ao pedido da Secretaria Municipal de Saúde de Manaus para o atendimento de bebês e mulheres internadas na maternidade Moura Tapajoz, em decorrência da escassez de oxigênio devido ao avanço da COVID-19. Trata-se de ação emergencial complementar à atuação que o UNFPA já tem empreendido no Amazonas e em outras quatro unidades da federação desde o início da pandemia.