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O surto de zika — e de microcefalia — expôs “falências” na garantia dos direitos das mulheres no Brasil. A conclusão é do representante do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) para o país, Jaime Nadal, que participou nesta semana (27) de um encontro no Rio de Janeiro para debater os desafios a longo prazo da epidemia da arbovirose. Evento foi promovido em parceria com a ONU Mulheres e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

Para Jaime Nadal, zika denunciou ‘falências’ na garantid dos direitos das mulheres. Foto: Pedro Andrade/UNIC Rio

De 8 de novembro de 2015 até o final de 2016, pouco mais de 10,2 mil casos de alterações no crescimento e desenvolvimento de recém-nascidos foram notificados às autoridades brasileiras como possivelmente associados ao zika.

Segundo o Ministério da Saúde, 2.205 ocorrências foram confirmadas como vinculadas à arbovirose ou outras infecções, e 2.829 permanecem sob investigação. Do total, mais da metade dos episódios já foram descartados, ou seja, não foram considerados síndromes congênitas do zika.

“O zika acontece num contexto histórico com uma série de determinantes sociais muito claramente definidos. Afeta principalmente a periferia, afeta principalmente as mulheres negras e jovens”, afirmou Nadal na reunião da chamada Sala de Situação sobre Zika, que teve a participação da sociedade civil, do governo e de outros Estados-membros da ONU, como a Holanda. Encontro aconteceu no Centro de Informação da ONU para o Brasil (UNIC Rio).

Uma análise de 5.194 casos suspeitos da síndrome congênita do zika — registrados pelo Ministério da Saúde no período de 4 de janeiro de 2015 a 27 de fevereiro de 2016 — revelou que 71,3% das mães dessas crianças tinham de 15 a 29 anos. Quase 77% das mães se declararam pardas e 7,8% se disseram negras. Quase 49% eram solteiras no momento do parto e outras 28,4% viviam em união estável.

O levantamento desagregado é da própria pasta federal e foi apresentado no evento por Carlos Albuquerque de Melo, consultor nacional de arboviroses e de manejo integrado de vetores da OPAS.

Segundo ele, enquanto os primeiros surtos de alterações congênitas afetaram sobretudo Pernambuco, Bahia e alguns estados do Sudeste, agora novos e mais numerosos casos — ainda em sua maioria sob investigação — têm sido registrados em outras partes do país, como no Pará e na região Sul.

“O sistema (de saúde) tem muito a melhorar, particularmente na atenção básica e também em termos de saúde sexual e reprodutiva. Tem ficado muito evidente que as mulheres não tinham um aconselhamento adequado durante o surto epidêmico”, ressaltou o representante do UNFPA.

“Muitas mulheres queriam adiar a gravidez ou não sabiam muito bem como fazer para se prevenir do zika já durante a gravidez. Ou sabiam do mosquito e usavam repelente, mas não sabiam da transmissão sexual”, explicou Nadal, para quem a proteção da população foi apenas “parcial” devido a essas lacunas.

“As mulheres têm que ser empoderadas, as comunidades têm que ser empoderadas”, completou o dirigente, destacando a importância de iniciativas a nível comunitário que difundem informação sobre saúde sexual e reprodutiva.

Encontro zika RJ 02

Ativistas, pesquisadores e representantes de ONGs participaram de encontro com representantes da ONU. Foto: Pedro Andrade/UNIC Rio

Informações do UNIC.