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A dinâmica de população do Brasil traz oportunidades e desafios em níveis estruturais, sociais e econômicos. Com uma estimativa apontando para, em 21 anos, dobrar o contingente de pessoas com mais de 65 anos, o país necessita discutir o perfil de políticas públicas para esta nova fase. O seminário “Demografia Econômica e Envelhecimento Populacional no Brasil: Desafios e perspectivas para políticas públicas”, que aconteceu nesta segunda-feira (19), em Brasília, trouxe à luz as inter-relações desse movimento populacional com a economia e potenciais soluções em termos de planejamento.

Organizado pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e pelo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MPDG), o evento reuniu mais de 120 pessoas entre especialistas, corpo acadêmico, representantes do governo e sociedade civil apresentando diferentes prognósticos para o futuro da economia brasileira frente ao envelhecimento. Com o apoio do Projeto “Demographic transition: opportunities and challenges to achieve the SDGs in Latin America and the Caribbean”, do Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento, coordenado pelo CELADE-Divisão de População da CEPAL, a atividade trouxe temas como contas nacionais, transferências intergeracionais, educação, mercado de trabalho, igualdade de gênero e ajuste fiscal.

Para Jaime Nadal, representante do UNFPA no Brasil, o envelhecimento populacional é um dos processos mais importantes do século XXI. O processo de envelhecimento é frequentemente associado aos custos previdenciário e com saúde, ao constrangimento da taxa de população, à estagnação da produtividade e dos investimentos e à pressão sobre o crescimento potencial. Porém, é também necessário reconhecer e potencializar os seus aspectos positivos.

“É necessário compreender que o envelhecimento é o resultado de avanços significativos no desenvolvimento e nas condições de vida dos países. As oportunidades que a demografia apresenta são infindáveis quanto às contribuições de uma população idosa economicamente ativa. O processo de envelhecimento acontece de maneira distinta quando analisada por sexo, raça, níveis socioeconômicos, nos meios rural e urbano. É fundamental que a administração pública leve em conta essas diferenças para que se construa uma política que reduza as iniquidades”, ressaltou o representante.

A janela de oportunidades do chamado bônus demográfico no Brasil está com os dias contados. Os contrastes internos apontam que é fundamental, por um lado, reforçar o investimento na formação de capital humano e modernização do mercado de trabalho para criar oportunidades de desenvolvimento para o grande contingente de pessoas jovens e, ao mesmo tempo, antecipar as questões relacionadas ao envelhecimento da população, que apresentarão novos desafios para a produtividade, para o modelo de crescimento econômico e para as finanças públicas.

Para Jorge Arbache, Secretário de Assuntos Internacionais do MPDG, existe uma dificuldade de se atingir o pleno potencial do trabalhador garantindo-lhe seus plenos direitos. “Por isso, eventos como esse é um passo importante para que se alinhe as demandas e as projeções populacionais no âmbito das políticas públicas para garantir a qualidade dos serviços em caráter nacional”, avalia o secretário.

De 1950 a 2015 a população brasileira ganhou 24 anos de esperança de vida, o que chega a aproximadamente quatro anos por década. Na mesa de debates, intitulada “Envelhecimento populacional, transferências intergeracionais e contas nacionais”, Paulo Saad, diretor da Centro Latino-Americano e Caribenho de Demografia, da CEPAL, apresentou as tendências demográficas na região da América Latina, incluindo o Brasil. “O que aconteceu foi uma rápida variação no padrão de crescimento populacional com altas taxas de fecundidade, para uma sociedade onde os nascimentos passaram a decrescer. Isso atrelado ao fato de que a esperança de vida aumenta constantemente, criando uma inversão da pirâmide etária”.

Cássio Turra, professor da do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, da Universidade Federal de Minas Gerais (CEDEPLAR/UFMG), mostrou que, seguindo essa lógica populacional, os programas de transferência públicas no Brasil, que outrora eram destinados para população mais jovens, com a transição, foi se adaptando à população adulta e idosa.

Investir em capital humano e superar as inequidades

O futuro desta população mais envelhecida dependerá diretamente dos investimentos feitos em capital humano nas populações mais jovens, que variam de acordo com as diferentes características da população brasileira. Eduardo Rios Neto, professor da CEDEPLAR/UFMG; Sergei Soares, ex-diretor do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e Rafael Lucchesi, diretor de Educação e Tecnologia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), debateram as diferentes perspectivas para o futuro, do ponto de vista do sistema educacional no Brasil. Sob o tema “Investindo em Educação: oportunidades e desafios frente ao envelhecimento”, os especialistas abordaram questões como analfabetismo, orçamentos, educação de jovens e adultos, e as distinções entre ensino básico, médio, superior e técnico no país.

Quando se debruça sobre as avaliações sociais e econômicas da população economicamente ativa no país pode-se visualizar uma elevação dos potenciais devido à inserção das mulheres no mercado de trabalho e no ensino superior. Segundo a PNAD Contínua, em 2017, mais da metade da população em idade de trabalhar era formada por mulheres, entretanto os homens representavam 57,2% da parcela da população no mercado de trabalho.

A discussão sobre os impactos das desigualdades de gênero na economia e no processo de envelhecimento populacional foi abordada pelas apresentações da professora Simone Wajnman Professora Titular do CEDEPLAR/UFMG, e pela diretora adjunta da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do IPEA, Enid Rocha. A mesa contou com os comentários do Professor do Departamento de Economia Universidade de Brasília, Carlos Alberto Ramos.

O desenvolvimento de políticas e ações que visem igualar as oportunidades entre homens e mulheres, seja para proporcionar uma maior participação feminina no mercado de trabalho, seja para igualar a divisão do trabalho doméstico, permite uma melhor preparação para uma sociedade mais envelhecida. “Ao analisar as transferências de contas nacionais incluindo as transferências de tempo, percebemos que as horas de dedicação aos trabalhos domésticos e aos cuidados, sejam de crianças ou de pessoas idosas, recai majoritariamente sobre as mulheres, em especial naquelas com níveis socioeconômicos mais desfavorecidos” explica a professora Simone Wajnman.

Apesar dos avanços observados, as inequidades de gênero no mercado de trabalho permanecem. Segundo a PNAD Contínua, em 2017, o rendimento médio mensal real de todos os trabalhos, no Brasil, foi de R$ 2 178. Entre os homens, registrou-se média de R$ 2 410, enquanto entre as mulheres, R$ 1 868, o que representava 77,5% do rendimento masculino.

Política econômica, ajuste fiscal e envelhecimento

É importante abordar o envelhecimento considerando a população idosa dinamicamente: com mais esperança de vida, melhores funções e capacidades cognitivas e mais educação e, portanto, com maior capacidade para contribuir produtivamente a sociedade. A quarta sessão debateu os impactos do processo de envelhecimento na política econômica e fiscal do país. Foram abordados temas como a adaptação tributária que o país tem passado para acompanhar a velocidade das mudanças sociais e como o Brasil pode se preparar do ponto de vista de seguridade social para as próximas décadas. A discussão contou com Emanuel Dantas, Coordenador-Geral de Estudos Previdenciários da Secretaria de Previdência do Ministério da Fazenda, Fernando de Holanda Filho, da Fundação Getúlio Vargas e Ricardo Pena, diretor da Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Executivo (Funpresp).

Por fim, o Secretário de Assuntos Internacionais do MPDG, Jorge Arbache apresentou uma síntese das discussões realizadas durante o evento e apontamentos para políticas públicas. O Secretário reforçou a importância de um crescimento econômico sustentado e sustentável, que leve em conta as transformações demográficas em curso. Destacou ainda a importância das políticas monetárias e fiscais e da competitividade internacional do Brasil, com uma atuação democrática, aberta e transparente.