Vinte jovens representando dez organismos do Sistema das Nações Unidas no Brasil participaram, na sexta-feira (16/8), das celebrações do Dia Internacional da Juventude, no escritório da Organização Pan-Americana de Saúde e Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS), em Brasília. Com o tema “A ONU que vemos, a ONU que queremos”, os participantes tiveram a oportunidade de apresentar suas visões e ideias inovadoras para promoção da mudança, principalmente nos assuntos que envolvem diretamente seu futuro e sobre o papel da ONU para garantir que os jovens não sejam deixados para trás.
Atualmente, existem 1,8 bilhão de jovens entre 10 e 24 anos no mundo. A maior população de jovens de todos os tempos. No entanto, mais da metade de todas as crianças e adolescentes com idades entre 6 e 14 anos não possuem habilidades básicas de leitura e matemática, apesar de a maioria deles frequentar a escola. No Brasil, segundo o IBGE, no ano de 2017, das 48,5 milhões de pessoas com idade entre 15 e 29 anos no país, aproximadamente 11 milhões não estavam trabalhando, nem estudando ou envolvida em alguma forma de qualificação.
“Em 2019, o Dia Internacional da Juventude completa 20 anos e, ao longo deste tempo, temos enfatizado a importância e reconhecido o esforço de jovens lideranças por um mundo mais justo”, destacou o Sr. Niky Fabiancic, coordenador-residente do Sistema Nações Unidas no Brasil. “Eu gostaria que todos refletissem sobre quais transformações queremos ver para preparar melhor os jovens para que sejam protagonistas neste novo mundo em transformação.”
Duplas formadas por um jovem que trabalha na ONU e um jovem beneficiado diretamente por algum projeto das Nações Unidas no Brasil foram convidadas para fazer discursos aos representantes de agências, fundos e programas da ONU sobre temas como diversidade, educação, saúde e comunicação. Participaram jovens dos seguintes organismos: OIM, ONU Mulheres, OPAS, PNUD, UNAIDS, UNESCO, UNFPA, UNICEF, UNODC e UNOPS.
Cada jovem teve autonomia para escolher seu tema e preparar seu discurso, apontando sua visão do trabalho da ONU no Brasil quando se trata de juventude, e quais mudanças e avanços esperam ver para a promoção dos Direitos Humanos, principalmente para o fortalecimento da participação de jovens em espaços de decisão.
“Fico feliz em ver jovens participando de reuniões e pelos corredores. Traz um novo ar ao nosso trabalho e mais dinamismo. Na resposta ao HIV, considerando uma epidemia que atinge principalmente os jovens, isso é muito importante”, disse Bruno Lindenberg, jovem LGBT de 21 anos e consultor do UNAIDS. “Podemos avançar muito mais quando os jovens são vistos como parceiros, mas ainda existem desafios a serem superados.”
Entre os pontos que foram levantados durante o evento, os jovens reforçaram a importância de ações efetivas como um programa de estágio remunerado e afirmativo em todas as agências da ONU. O objetivo é garantir que os espaços de trabalho sejam cada vez mais diversos, garantindo a possibilidade de acesso a jovens de diferentes esferas da sociedade.
“Comecei no UNFPA em um programa de estágio afirmativo e hoje faço parte da equipe de Operações. Em espaços como esse, me esforço para contribuir na criação e manutenção de práticas afirmativas para população negra, pois ainda é preciso investir na formação de equipes com pessoas das populações mais marginalizadas”, disse João Henrique Souza Lima, assistente de Operações e Recursos Humanos no UNFPA.
Ao final dos discursos de cada jovem, os representantes dos organismos da ONU e o coordenador-residente das Nações Unidas no Brasil agradeceram a oportunidade de ouvir e compartilhar este momento com jovens de diferentes realidades e perspectivas.
“Estamos aqui representando uma senhora de 73 anos, que é a ONU, com dificuldade de acessibilidade e de comunicação para falar com jovens do mundo todo. Os recados foram ouvidos, e tenho a esperança de que a ONU que queremos para o futuro vai refletir o mundo que desejamos”, reforçou Júnia Quiroga, representante auxiliar do UNFPA no Brasil.
Além disso, os representantes reforçaram que é extremamente necessário garantir que a Organização das Nações Unidas seja cada vez mais um espaço inclusivo, com a efetiva participação dos jovens, principalmente para o cumprimento das metas assumidas com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
“Divulgar a ONU nas escolas, visitas à casa da ONU, remuneração dos estagiários, acho que essas medidas são fundamentais, pois vão fazer com que mais jovens conheçam e sonhem com a ONU. A gente precisa trabalhar para que mais e mais jovens tenham esse direito de sonhar e fazer parte desta mudança, seja dentro das Nações Unidas ou trabalhando em suas comunidades”, lembrou Cleiton Euzebio, diretor interino do UNAIDS no Brasil.
“Ninguém faz um trabalho em um escritório sem conhecer as pessoas e as realidades. Estamos muito felizes pelas orientações sobre como vamos fazer para ter novos processos seletivos, porque abre as portas de como fazer as coisas de forma diferente”, concluiu Haydee Padilla, coordenadora da Unidade Técnica de Família, Gênero e Curso de Vida da OPAS/OMS no Brasil.
Dia Internacional da Juventude
O dia 12 de agosto foi designado pela primeira vez como Dia Internacional da Juventude pela Assembleia Geral da ONU em 1999 e é uma celebração anual para lembrar a importância do papel de mulheres e homens jovens como parceiros essenciais na mudança, além de ser uma oportunidade de conscientização sobre os desafios e problemas enfrentados pela juventude mundial. O tema deste ano destaca os esforços para tornar a educação mais inclusiva e acessível para todos os jovens.
Depoimentos
“Eu venho de uma família pobre e negra e, quando falei que ia trabalhar na OPAS, meus familiares e amigos não sabiam o que era. Eu acredito que por meio dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e da educação, a ONU pode ter ainda mais visibilidade junto a pessoas de periferia e negras, e mais pessoas vão ter acesso a este espaço.”
Alessio Souza, assistente administrativo na OPAS
“A ONU que vejo é uma ONU em mudanças, que enfrenta os desafios de encarar uma nova juventude que se organiza de uma forma diferente, que interage de forma diferente, e que tem outras perspectivas. Existem muitos desafios, mas também muitos esforços para que a ONU seja diferente de quando foi criada.”
Augusto Souza, oficial de programas do UNICEF para as áreas de proteção e educação
“Fico feliz em ver como mudou o retrato da ONU nestes últimos anos, com jovens participando de reuniões e pelos corredores. Na resposta ao HIV, considerando uma epidemia que atinge principalmente os jovens, isso é muito importante. Também é importante pautar a remuneração dos estagiários, para que a ONU valorize de forma equitativa todas as pessoas que contribuem para o desenvolvimento da organização.”
Bruno Ferreira Lindenberg, consultor de Operações no UNAIDS
“Eu acho que inverti a pergunta, para como a ONU nos vê, como alguém que pode liderar, mudar e criar um mundo melhor. A ONU compartilha dos valores de saber que somos iguais, independente da nossa raça e cor.”
Cauã Felipe, diretor executivo da escola de Rugby de Samambaia, e participou do programa do PNUD de Fortalecimento do Voluntariado no Brasil
“A ONU que queremos é uma ONU que saiba divulgar seus eventos e ações. Eu gostaria que as Nações Unidas formassem uma equipe e para visitar os locais ocupados por jovens, para conhecer e entender a realidade.”
Daniel Rodrigues Fernandes, membro eleito do Comitê Consultivo do Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente do Distrito Federal (CDCA)
“A ONU de amanhã precisa se aproximar das pessoas a partir de uma linguagem cada vez mais compreensiva e acessível, com uma comunicação e diversificação cada vez maiores dos quadros de funcionários, e o fortalecimento das redes sociais e presença das agências em meios de comunicação. A ONU segue como um lugar de difícil acesso aos jovens de renda mais baixa, e o estágio não remunerado é a primeira barreira.”
Elise Reiche Pereira, assistente de Assessoria Jurídica da UNESCO
“A ONU que queremos pode se aproximar mais da juventude. Precisamos incluir mais jovens e adolescentes nas decisões diárias, escutar mais as juventudes, apoiar as redes de liderança e reconhecer a necessidade de compreender as necessidades que temos. Esse diálogo deve ser interminável, e que bom que há vontade de ir muito além do que já foi feito.”
Iana Mallmann, liderou a rede de Adolescentes LGBT, com apoio do UNICEF
“Comecei no UNFPA em um programa de estágio afirmativo e hoje faço parte da equipe de Operações. Em espaços como esse, me esforço para contribuir na criação e manutenção de práticas afirmativas para população negra, pois ainda é preciso investir na formação de equipes com pessoas das populações mais marginalizadas.”
João Henrique Sousa Lima, assistente de Operações e Recursos Humanos do UNFPA
“Os jovens são as mentes pensantes do amanhã, e a contribuição que podemos oferecer é de uma riqueza extrema. A ONU que precisamos é uma ONU mais diversa, que abranja diferentes vivências, experiências e realidades. Sinto orgulho de fazer parte de uma organização preocupada em possibilitar melhores oportunidades para tantos indivíduos. É imprescindível que nunca deixemos de lado nossas lutas e convicções.”
Julia Cruz Caneiro Tavares, assistente de Operações na OIM
“Acredito que um ponto importante é olhar para as pessoas as quais damos oportunidade de trabalho. Às vezes, em algum processo de contratação, a gente gostaria de valorizar pessoas mais humildes e pequenos produtores, mas o processo de contratação é extremamente difícil, e é preciso pensar em como podemos acessar essas pessoas, como nossos sistemas podem ser mais simples.”
Julia Matravolgyi, assistente de projeto na Unidade de Paz e Governança do PNUD
“Me sinto privilegiada, e acredito que junto com o privilégio vem uma obrigação de retribuir o que nos foi dado. Com a responsabilidade de trabalhar por aqueles que não estão onde eu estou. É importante trazer estudantes e jovens, dar a oportunidade para que jovens nos conheçam, mostrar que somos acessíveis. A ONU que eu quero é uma ONU acessível.”
Mariana Paula Salvadori, consultora na UNESCO
“Ser jovem na ONU significa ter muito trabalho, muitos desafios e muitas possibilidades. Aqui eu sei existe um espaço de respeito mútuo. Desejo que o sistema ainda engaje muitos jovens líderes, com mais diversidade, com o objetivo de alcançar um mundo melhor.”
Patrícia Nascimento dos Santos, trainee administrativa do UNOPS
“Hoje, estando do lado de dentro, vejo uma ONU capaz de mudar e empoderar a vida de pessoas, e de colocar as pautas de desenvolvimento sustentável de maneira inclusiva sem deixar ninguém para trás. A ONU que quero ver é uma ONU que não seja apenas formada por mais jovens, mas também mais negros, indígenas, ciganos, cada vez mais representada pelos grupos que queremos empoderar.”
Raquel Bennet Fagundes, UNV e assistente da coordenação do Grupo Temático de Gênero, Raça e Etnia na ONU Mulheres
“Estamos em um espaço onde foi falado de diversidade, mas continuo sendo a única indígena, e esse espaço não é só meu. Dentro das nações unidas no Brasil fomos apenas três indígenas, então é preciso olhar e pensar ‘será que estamos deixando alguém para trás’?”.
Rayanne França, membro da Rede de Juventude Indígena (REJUINDI), apoiada pela OPAS
“Reconheço vários avanços na ONU, como um sistema com mais força de vontade de reconhecer as diferenças. A presença da juventude é extremamente marcante, e existem pessoas transexuais, quilombolas, indígenas, pessoas negras, e precisamos manter e incentivar que isso continue. Reconheço um compromisso trazendo a juventude pra dentro do contexto 2030. Aprendi que juventude não é um conceito singular, mas sim um conjunto diverso que precisa de atenção igual. É necessário investir na juventude, perder o medo de investir na juventude.”
Rodrigo Araújo, assistente sênior de projetos no UNODC
“Eu tive a oportunidade de estar em vários espaços dentro da ONU e vi, em Brasília, uma oportunidade de crescer me assumir como mulher trans. Apesar de ser uma cidade grande, não tive oportunidades de me recolocar no mercado de trabalho e várias portas se fecharam. A ONU abriu as portas que todos fecharam e me acolheu quando eu mais precisei. Me empoderou e hoje, quando eu olho pra trás, vejo que consegui superar. Vislumbro uma ONU que ofereça essas oportunidades e leve as pessoas vulneráveis a seguir em frente.”
Wanda de Araújo Marques, assessora na administração regional do Plano Piloto (DF), e participante do curso de Orçamento Público em Saúde, Advocacy e Negociação para Jovens Lideranças no Distrito Federal, promovido pelo UNAIDS
“É fato que o grupo está se diversificando, e olha as representações de juventude que a gente tem aqui. Isso é muito significativo. Essa é a ONU que eu vejo, que fortalece iniciativas para o desenvolvimento da juventude. A ONU que eu quero é essa que pensa nesse contexto, e educação é uma porta extremamente significativa e pensar em um território como a ONU que pensa em uma educação transformadora, que presta atenção no que a juventude está dizendo, acredito que a ONU pode trabalhar nessa perspectiva que pode conversar com a juventude a partir do que a própria juventude faz.”
Wallison de Souza, coletivo da cidade e programa Embaixadores da Juventude do UNODC
“Saí da Venezuela em janeiro, e foi muito triste deixar minha família, minha casa, e para mim não foi fácil, mas graças a Deus estou aqui. Minha primeira experiência foi em Pacaraima. Quando cheguei lá, não sabia o que fazer e estava assustada, e pedi muito para Deus nos ajudar, pois sair de seu país não é fácil. Depois a segunda experiência foi em Boa Vista, e não foi fácil, mas a ONU nos ajudou, deu seu apoio, e ajudaram muito. É muito difícil aprender outro idioma, mas agradeço de verdade a OIM que nos ajudou muito a encontrar com minha família e minha filha, e mando muito obrigada a todas as pessoas que estão trabalhando conosco e nos deram sua atenção.”
Yorgelis Del Valle Bastardo Caibe, migrante venezuelana interiorizada pela OIM