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“(...) Liberdade já raiou, Igualdade ainda não. O negro é o braço forte, é o orgulho da nação”. Ao som da ladinha de capoeira, teve inicio no último dia 3 a Reunião Regional para a Década Internacional de Afrodescendentes da ONU, realizada em Brasília, que reuniu representantes de governo e da sociedade civil de países latino-americanos e do Caribe.

 

A Década Internacional de Afrodescentes foi aprovada na Assembleia Geral ONU e seu mandato será de 2015 a 2024

O evento, organizado pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) em parceria com o governo brasileiro, contou com a presença do Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, em visita oficial ao país.  Zeid destacou a necessidade de os países trabalharem em grupo para implementar as ações determinadas pela agenda da Década Internacional de Afrodescendentes, celebrada de 2015 a 2024.

“A Década é uma oportunidade para levar adiante reformas em todas as regiões, mas também para aplicar com firmeza as leis e implementar as políticas e programas para trazer melhorias tangíveis na vida de afrodescendentes”, disse o Alto Comissário, Zeid Ra’ad Al Hussein. “Uma década é realmente um tempo curto, mas se nós definirmos metas concretas, elas podem ser capazes de fazer uma diferença transformadora nos 10 anos decisivos da vida de uma criança.”

 

Para a Ministra Nilma Lino Gomes, do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos, o governo brasileiro tem se empenhado na criação de ações afirmativas que buscam diminuir as desigualdades, mas ressaltou que “estamos conscientes das dificuldades; os países da região reconhecem a preocupação com os direitos de afrodescentes e trabalham em parceria para a construção das ações da Década para combater o racismo, a xenofobia e a discriminação”.

O representante do UNFPA Brasil, Jaime Nadal, também participou da abertura da Reunião Regional. Ele explicou que a Década Internacional de Afrodescendentes está baseada em três pilares - justiça, desenvolvimento e reconhecimento, que "são fundamentais para tentar recompor a situação de injustiça e violência estrutural e institucional que ocorre em todos os países contra as pessoas afrodescendentes. O que tem que acontecer ao longo dessa década é reverter essa situação de discriminação histórica contra essa população, através desses três pilares".

Durante a mesa de debate sobre desenvolvimento, a pesquisadora Edna Santos Roland ressaltou a importância do tema para que os países possam alcançar os objetivos da Década. Para ela, o desenvolvimento deve garantir a participação ativa e significativa dos afrodescentes no processo de tomada de decisão. “Os três temas dessa década são intrinsecamente interconectados. Reconhecimento e justiça são essenciais para o avanço no desenvolvimento da mesma forma como o desenvolvimento contribuirá para o avanço da justiça.”

Os recentes casos de intolerância religiosa e extermínio de cinco jovens negros no Rio de Janeiro também foram lembrados durante a reunião. Douglas Belchior, representante da UNEAFRO, propôs um minuto de silêncio em homenagem as vítimas e suas famílias. E atentou para o fato de o Brasil ser o país que mais mata sua população negra no mundo.  “Não é possível desenvolvimento com genocídio, não é possível desenvolvimento sem educação. E essa é a realidade brasileira, que não difere da realidade latina. Nós falamos de um lugar secularmente oprimido. A história da América é uma história de genocídio, a história do Brasil é uma história de genocídio continuado.”

O Alto Comissário também participou do encerramento da reunião, na última sexta-feira (4). Zeid pediu aos países que respeitem os seus compromissos e obrigações nos termos do direito internacional dos direitos humanos e usem todas as ferramentas à sua disposição para promover progressos concretos na promoção dos direitos de afrodescendentes.

No final da reunião, os delegados adotaram uma declaração que relembra o Programa de Atividades da Década Internacional e reafirma seu compromisso com a plena implementação da Declaração e Programa de Ação de Durban em nível nacional, regional e global. Além disso, reafirma o apoio à criação do Fórum de Pessoas Afrodescendentes e apoia a elaboração de um projeto de Declaração das Nações Unidas, destacando a importância de iniciar o trabalho o mais rapidamente possível. Estados-membros da ONU também se comprometeram a adotar políticas de ação afirmativa de modo a atenuar e corrigir desigualdades no exercício dos direitos humanos no acesso à educação e ao emprego, de acordo com as particularidades de cada país.

“Entramos na Década Internacional de Afrodescendentes com uma imensa carga de injustiças históricas e contemporâneas, de tal forma que é difícil não se curvar sob o peso de desespero”, disse Zeid. “No entanto, nós temos aqui uma oportunidade para ajudar a fortalecer as comunidades de ascendência africana e, com elas, reforçar a estabilidade, a democracia, o Estado de Direito, a governança, a segurança e o desenvolvimento de toda a região da América Latina e do Caribe. Devemos aproveitar esta oportunidade para explorar o potencial inexplorado destas comunidades até então invisíveis. Que nos comprometamos a usar esses 10 anos para dar um passo à frente.”

(Por Mariana Tavares, com informações da UNIC)