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Por Pedro Sibahi

 

O Dispositivo Intrauterino (DIU) de cobre é um método contraceptivo com alta eficácia (acima de 99%), poucos efeitos colaterais e longa duração, sendo efetivo por 10 anos, mas que é usado por menos de 2% das mulheres brasileiras, de acordo com dados da última pesquisa nacional de saúde, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2013. No país, a baixa adesão é relacionada à carência ou dificuldade de acesso a médicos ou a programas de planejamento reprodutivo, além da falta de informações. 

Essa realidade começa a mudar em Boa Vista, Roraima, a partir da Capacitação em Colocação de DIU realizada pela equipe de Saúde Sexual e Reprodutiva do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), com cerca de 50 profissionais ligados à Secretaria Municipal de Saúde, entre médicas e médicos, enfermeiras e enfermeiros.

O processo de capacitação realizado pelo UNFPA na capital de Roraima teve início no dia 4 de setembro com uma aula teórica e seguiu com oficinas práticas que já atenderam mais de 200 mulheres, entre brasileiras e venezuelanas refugiadas e migrantes. Elas tiveram seus DIUs colocados pelos profissionais da cidade com apoio da equipe do UNFPA. 

A médica Rebeca Laís Quaiato, 33 anos, é uma das profissionais que participou da capacitação, não só colocando o DIU em outras mulheres, mas recebendo ela mesma o método contraceptivo. 

“O DIU sempre foi uma espécie de tabu, havia muita desinformação. Eu mesma tinha um pouco de receio, sempre fiz uso do anticoncepcional oral, mas sentia na pele os efeitos do uso continuado”, afirmou a médica Rebeca Laís Quaiato. Ela relatou ainda que viu na capacitação uma oportunidade de colocar o DIU para experimentar no próprio corpo o método contraceptivo que vai indicar para outras mulheres. 

“Estou adorando, não me causou desconfortos, e acredito que futuramente, a curto prazo, o efeito será muito melhor que anticoncepcionais orais. Já sinto diferença no humor, na disponibilidade de realizar atividades. Eu diria que foi libertador”, diz Rebeca Laís Quaiato.

A capacitação promovida pelo UNFPA está permitindo que as mulheres de Boa Vista coloquem o DIU na atenção primária, ou seja, em atendimento nas Unidades Básicas de Saúde e durante as consultas ginecológicas, sem necessidade de deslocamento até o hospital.

Brunely Galvão é a profissional que está realizando as atividades de capacitação pelo UNFPA. Ginecologista obstetra com especialização em saúde sexual pela Universidade de São Paulo (USP), ela explica que essa realidade está mudando “porque o Fundo de População das Nações Unidas dissemina  boas práticas, baseadas nos protocolos mais atualizados do Ministério da Saúde e do Center for Disease Control and Prevention (Centro de Controle e Prevenção de Doenças)”. 

“Estamos desfazendo mitos sobre a colocação do DIU, mostrando que aquela bateria de exames que costumavam pedir, só atrasa o acesso a um método contraceptivo barato, eficaz e que diminui em 30% o risco de desenvolver câncer de colo do útero”, afirma Brunely Galvão, relembrando que a região norte tem a maior incidência dessa doença no país.

A médica explica que “os exames colocados como obrigatórios por muitos profissionais de saúde, como citologia de colo uterino, ultrassom e exames de sangue, não contribuem para segurança nem para eficácia do método. A única coisa que é obrigatória para a colocação do DIU é o exame clínico e ausência de gestação. O exame de imagem só é necessário caso a paciente tenha histórico de má formação uterina”.

“É importante destacar que não apenas médicos, mas enfermeiros e obstetrizes têm competência para a colocação de DIU, inclusive com boas experiências em países como a Inglaterra”, completa a médica Brunely Galvão.

Atuando pelo sistema de saúde municipal, a médica Rebeca Quaiato relatou que após a capacitação houve um grande aumento na procura pelo contraceptivo. “Em menos de uma semana tínhamos mais de 20 mulheres interessadas, em menos de 1 mês passamos de 35 mulheres interessadas. Tem um interesse real de uma população por esse método”, completa a médica

Uma das beneficiadas pelo método foi Jeanne Arias, 42 anos, migrante venezuelana que vive no Brasil há 2 anos. Ela conta que já possui cinco filhos e não gostava dos efeitos colaterais da pílula anticoncepcional, por isso queria colocar o DIU. “Antes, para marcar uma consulta com um ginecologista e fazer todos os exame era muito difícil. As pílulas me davam enxaqueca, então, quando essa oportunidade se apresentou, achei ótimo”.

A nutricionista Julia Carla Rodrigues, de 28 anos, também está entre as beneficiadas pela facilitação no acesso ao método contraceptivo. “Sempre tive interesse em colocar o DIU, mas como minha vida sempre foi corrida, não tinha muito acesso em Manaus, onde morava antes. Lá, é bem difícil o acesso no SUS para conseguir esse procedimento, não é fácil”. Ela afirma que ainda não pretende ter filhos para priorizar a carreira e viu no DIU a melhor opção. “Também queria parar de tomar medicamento, estava mexendo muito com meus hormônio”, relata.

Após a capacitação, os e as profissionais de saúde de Boa Vista estarão aptos a seguir a colocação de DIUs no municípios enquanto estiverem atuando profissionalmente.

 

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