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Lellêzinha, 18 anos

 

Sempre tive o sonho de ser artista. Comecei a dançar com 6 anos e meu sonho era ser igual Beyoncé. Eu era muito fã dela, ficava vendo o DVD e não sossegava enquanto não fazia igualzinho. Foi assim que cresci na dança, sempre amei dançar!

Tudo começou com o funk, com 11 anos comecei a me interessar pelo Passinho. Mas o Passinho era um movimento bem masculino, não havia nenhuma menina e muitas pessoas me criticavam, diziam que não era coisa de mulher, que era uma dança masculina e que seria o mundo contra mim. Mas eu gostava daquilo! Não estava nem aí se era coisa de homem ou não, eu sempre fui muito assim. Lógico que eu não tinha noção dessa minha determinação, as pessoas continuavam falando e eu continuava fazendo o que eu achava que era bom para mim.

Fiz alguns trabalhos e depois da Batalha do Passinho fui convidada para gravar o Aperte o Play. A gente tinha que criar a versão funk da música que seria o tema oficial da Copa para o Brasil inteiro pegar. Em uma semana a coreografia teve 1 milhão de visualizações e os contratantes começaram a ligar pedindo show de 1h, só que a gente não era um grupo... Foi aí que a gente sentou e conversou: será que a gente vira um grupo?

Na verdade, o sonho de cada um era, e é, levar o Passinho para o mundo inteiro e elevá-lo como cultura, assim como o samba e o frevo, ainda mais por ser uma cultura da favela que a gente valoriza muito.

Logo em seguida veio a gravadora Sony Music que perguntou se a gente queria assinar um contrato e fazer um álbum. Eu falei: gente, mas como assim?! E foi aquela correria, quem não escrevia começou a compor, a criatividade da favela começou a aparecer. A gente sempre se vira, sempre dá um jeito e nesse jeitinho a gente foi conquistando outras coisas e hoje estou aqui, já fiz novela, já fiz mini-série, e agradeço muito ao grupo! Cada um teve sua conquista pessoal, todo o mundo já pode ajudar a família, ter uma vida um pouco melhor mas a nossa meta também é dar voz a quem está na comunidade. A gente tem essa consciência de que a gente também tem que falar por essas pessoas, falar nossa verdade, contar nossa história, nossa cultura.

O zika afetou as comunidades de uma forma geral e inclusivé a minha mãe teve zika, eu lembro que ela ficou muito ruim. Eu não tinha o entendimento sobre o que era o zika, fui pesquisar e na verdade é uma questão de saúde pública. Eu fico muito assustada porque são pessoas, são seres humanos que trabalham, que não podem ficar em casa, são pessoas que têm que correr atrás para colocar comida dentro de casa e o zika exige repouso. Eu acho que foi uma falta de cuidado, falta de saneamento, a gente passa muito isso dentro da comunidade e de uma certa forma são doenças novas que se a gente não tomar cuidado, se a gente não pensar no futuro, vão surgir outras ainda mais graves que, acredito, vão ferrar com a vida de todo o mundo.

O que mais me preocupa no Brasil é a educação e a saúde, é a falta de respeito pelas pessoas. A política me preocupa muito. Qual é o objetivo da política? Melhorar o país? É o quê, é ver quem é mais inteligente? Quem tem mais poder? Quem fatura mais? Qual é o objetivo deles? Eu não entendo.

A gente usa a nossa arte para falar sobre isso, a gente usa a nossa música, a nossa história para se manifestar no palco. Mas e as pessoas que não têm onde se manifestar vão fazer o quê?

Levar a cultura do Passinho para o mundo é o meu sonho e é o sonho de todos os molequinhos da favela. É a minha cultura que veio da favela do Rio de Janeiro, é a cultura que mudou a minha vida, mudou a vida dos meus parceiros e amigos e nosso maior sonho é deixar esse legado para os meninos novos que estão vindo aí com tudo, dando continuidade ao nosso movimento.