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Brasília – As experiências de promoção da saúde da população negra no município de Porto Alegre foram debatidas na quinta-feira (19) em encontro realizado em Brasília (DF), pelo UNFPA, Fundo de População das Nações Unidas. Trinta participantes do projeto “Promotor@s de Saúde da População Negra” apresentaram algumas das mais de 300 atividades realizadas este ano em todas as regiões da capital gaúcha, entre palestras, rodas de conversa e visitas de campo, e discutiram a continuidade das ações, realizadas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) do Serviço Único de Saúde (SUS), em escolas públicas e nas comunidades.

O Representante do UNFPA no Brasil, Jaime Nadal Roig, participou do encontro e reiterou o compromisso do Fundo de População em seguir apoiando a iniciativa, que visa enfrentar o racismo institucional na área da saúde e trabalha a questão do racismo como determinante das condições de saúde da população negra.

O projeto “Promotor@s de Saúde da População Negra” foi criado para fortalecer a implementação da Política Nacional de Saúde Integral da Saúde da População Negra no município de Porto Alegre, através da atuação qualificada das/os trabalhadoras/es de saúde e da organização de uma rede de trabalhadoras/es que atuem na promoção e atenção à saúde da saúde da população negra. Busca também o fortalecimento do controle social para a atuação em prol da saúde da população negra, problematizando, entre as/os gestoras de saúde, os determinantes sociais das condições de saúde, dando o devido destaque ao racismo institucional.

 

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om o Representante do UNFPA no Brasil, Jaime Nadal Roig (centro)

 

O projeto é coordenado pela Área Técnica de Saúde da População Negra da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Porto Alegre, sendo realizado em parceria com o Ministério da Saúde e com o UNFPA, que apoia a iniciativa desde 2012. Naquele ano foram formados 44 trabalhadores/as. A partir de 2013, o número de turmas aumentou e em 2014 o curso passou a ser um curso de Extensão Universitária, tendo como parceira a Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O curso acontece durante seis meses e os conteúdos são organizados em seis módulos temáticos. As turmas são compostas por cerca de 50 pessoas, sendo 80% trabalhadores/as da saúde, e 20% usuários/as e estudantes universitários/as. 

Em 2013, o projeto recebeu o prêmio Destaque em Saúde do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre. Dez turmas já foram formadas, totalizando 350 participantes, entre trabalhadores/as da área de saúde (enfermeiras, médicas, agentes de saúde, psicólogas), conselheiras/os de saúde, usuários/as e universitários/as. 

Durante o encontro, Elaine Oliveira Soares, coordenadora da Área Técnica de Saúde da População Negra da SMS, agradeceu o suporte do UNFPA, destacando o apoio técnico recebido. “O Fundo foi determinante para mostrar que temos instrumentos de garantia de direitos, para mostrar que estamos no caminho certo do combate ao racismo no SUS”. Ela explicou que o projeto promotores/as não se limita ao curso e tem caráter mas abrangente. “Além de apresentar uma discussão temática sobre a saúde, trazemos para a discussão a luta social, que é a desconstrução do racismo institucional, com grande impacto para o SUS e para a vida de homens e mulheres negras. Com isso, o projeto traz resultados em várias dimensões. Muitas participantes se reconheceram como pessoas negras e passaram a ser protagonistas dessa luta”. 

Outro resultado apontado por ela foi o trabalho coletivo, que envolveu outras áreas do governo municipal na implementação da Política Nacional Integral de Saúde da População Negra. “O projeto está em todos os espaços, em todas as regiões, garantindo que essa política passe a ser uma política institucional desta Secretaria. Além disso, fortalece a sociedade civil e os espaços de controle social como o Conselho Municipal de Saúde”. Órgãos como o Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) e a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre (SMED) estão agora engajados, segundo a pedagoga Luciana Oliveira Machado, uma das promotoras participantes do encontro. A assistente social Rosimari Fernandes Clemoni mencionou também o Serviço de Atendimento da Família (SAF/Clube de Mães Amizade da Região Glória), entre outros.

O Representante do UNFPA parabenizou a participação das promotoras na Marcha das Mulheres Negras realizada no dia 18 de novembro “precisamos de mais Marchas como esta, para que um dia a igualdade seja uma realidade, não apenas uma expectativa” e lembrou as origens das Nações Unidas, criadas em 1945 para promover a paz, o desenvolvimento e os direitos humanos. “A agenda que vocês desenvolvem está no coração do que fazemos”, disse ele. 

Falando sobre o papel do UNFPA, Jaime Nadal Roig lembrou que, no contexto brasileiro, o Fundo trabalha para que “as jovens mulheres negras tenham as mesmas oportunidades na sociedade que qualquer pessoa, (...) possam decidir sobre quando e como ter filhos e não sejam vítimas da violência” e isso significa trabalhar com o setor da saúde. Ele incentivou as promotoras a “continuarem com seu ativismo, trabalhando com as comunidades e reclamando às autoridades para que suas demandas sejam atendidas (...) Sua causa é nossa causa também”, completou.

A Representante Auxiliar do UNFPA, Fernanda Lopes, disse que a experiência de Porto Alegre na implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra “é um exemplo para o país”, observando a importância de valorizar a institucionalidade alcançada. “Isso é que vai garantir a transformação e, uma vez transformadas as realidades dentro e fora dos serviços, que isso se mantenha”. 

Durante o encontro, as participantes receberam também informações sobre a Década de Afrodescendentes da ONU e sobre o sistema global de proteção de direitos humanos, apresentados pela Oficial de Projetos em Gênero e Raça do UNFPA, Ana Cláudia Pereira. Também discutiram o Caso Alyne Pimentel, jovem negra grávida que faleceu devido à negligência no atendimento médico. O episódio resultou numa série de recomendações feitas ao Brasil pelo Comitê de Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher (CEDAW), uma das instâncias do Sistema ONU. O país pagou uma indenização à família de Alyne Pimentel e teve que adotar várias ações para evitar a repetição de casos como este.

Texto de Ulisses Lacava

*atualizado às 15h47