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Editorial por Jaime Nadal Roig - Representante, Fundo de População das Nações Unidas Brasil (UNFPA)

Há um outro lado do vírus zika que tem sido ignorado. Para nós, Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), trata-se de uma oportunidade para investir em políticas de saúde integral, programas e ações em saúde sexual e reprodutiva. É nesse sentido que temos trabalhado, através de parcerias com a sociedade civil e instituições governamentais, buscando colocar os direitos das jovens e mulheres no centro da resposta à epidemia.

Hoje se celebra o Dia Mundial da População. Esse ano o tema escolhido é “Investir nas Adolescentes” e vale a pena lembrar a Agenda 2030 - criada pelos Estados-membros das Nações Unidas com o intuito de mobilizar o mundo para o desenvolvimento sustentável.

A saúde sexual e reprodutiva é um direito humano e implica a capacidade de usufruir de uma vida sexual satisfatória e sem riscos.

A gravidez não planejada na adolescência está diretamente relacionada com as desigualdades de gênero, entre outras, que afetam particularmente as jovens de estratos sociais mais vulneráveis. A mensagem do Diretor Executivo do UNFPA, Dr. Babatunde Osotimehin, nessa data é que o sucesso da nova agenda de desenvolvimento sustentável depende do investimento nas jovens adolescentes.

Em muitos países, a chegada da puberdade representa o momento em que as meninas são entregues para o matrimônio e a maternidade, tendo que abandonar os estudos. Sem acesso à educação formal de qualidade, com restrições de acesso à saúde e sem controle sobre seu próprio corpo, as chances dessas meninas desenvolverem seu projeto de vida e se incorporarem de forma ativa na vida social e econômica ficam substancialmente comprometidas.

No Brasil, dados do IBGE (2010) indicam que 45.785 adolescentes de 10 a 14 anos estão em união estável ou casadas, colocando o país entre os 40 com maior incidência do matrimônio precoce e em quarto lugar dos países da America Latina e Caribe. Quanto à gravidez na adolescência, segundo o Ministério da Saúde, em 2014 nasceram 28.244 crianças filhos de meninas entre 10 e 14 anos e 534.364 crianças filhos de mães na faixa de 15 a 19 anos, sendo os estados do Norte do Brasil aqueles onde as taxas de gravidez na adolescência são maiores. Dessas mães adolescentes, 7 de cada 10 eram pretas ou pardas, e 6 de cada 10 não estudavam nem trabalhavam, ou seja, a maternidade é, lamentavelmente, seu único projeto de vida.  A sociedade deve considerar que a gravidez não planejada na adolescência também resulta de violência sexual.

As desigualdades e a falta de acesso a serviços públicos de qualidade estão na origem do surto epidêmico do Zika, constatando-se que as populações socialmente mais vulneráveis são também as mais afetadas pela infecção.  Infelizmente, a epidemia do Zika trouxe medo, estigma, discriminação e preconceito e é nossa responsabilidade dirimir esse sofrimento.  Comecemos então por garantir o bem-estar físico, mental e social. Em suma, o direito a ter direitos.

Investir nas meninas adolescentes - e também nos meninos - significa promover sua participação efetiva e contribuir para ampliar seu repertório de direitos. Relações interpessoais, autoestima, promoção da paz e da não violência, não discriminação de gênero, raça ou cor, e educação em sexualidade formam um conjunto de aspectos essenciais na formação de adolescentes e jovens e na construção de sociedades mais justas e resilientes.  Nosso papel é trabalhar para que os direitos universais sejam protegidos e promovidos, para que exista equidade no acesso a oportunidades e que “ninguém seja deixado para trás”.