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Com formação interdisciplinar, obstetrizes trazem olhar amplo para saúde da mulher, valorizando questões culturais, acesso à informação e entendimento do corpo

Por Pedro Sibahi

 

“Gosto de ser reconhecida como parteira e parceira das mulheres”, afirma a obstetriz Fernanda Vieira de Castro Alves, que atua pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) em Roraima. Ela é parte da equipe de assistência humanitária no contexto da Operação Acolhida, que atende pessoas refugiadas e migrantes vindas da Venezuela. 

Acostumada a trabalhar em centros obstétricos, com plantões e rotinas intensas, acompanhando dezenas de partos por dia, Fernanda diz que a realização no trabalho humanitário vem principalmente do apoio dado às mulheres com informações e assistência qualificadas antes e durante a gestação, realizando encaminhamentos quando necessário e propiciando mais segurança para que os partos ocorram da melhor maneira possível, além de apoiar o acesso a medidas de planejamento reprodutivo, fortalecendo o poder de escolha sobre o próprio corpo.

“Me sinto muito feliz por atuar no contexto de emergência humanitária, especialmente pela oportunidade de prestar assistência a meninas e mulheres, visando a integralidade no cuidado, seja no aconselhamentos do planejamento reprodutivo, na inserção de DIU, nas consultas de pré-natal ou nas sessões informativas sobre Infecções Sexualmente Transmissíveis", conta Fernanda, formada em 2015 pelo curso graduação em Obstetrícia da Universidade de São Paulo, único do gênero no país.

“A formação em Obstetrícia me permitiu reconhecer e enxergar a individualidade de cada mulher, especialmente nos diferentes contextos culturais”, diz Fernanda. "Trabalhando num cenário de fluxo migratório do porte que temos em Boa Vista, faz todo sentido entender quem é essa mulher atendida, em qual sistema de saúde que ela estava inserida antes de entrar aqui, quais mitos e conhecimentos elas trazem para o entendimento do processo de saúde e doença, mas também do que é seu corpo e o processo de parir”.

A importância das parteiras tradicionais e obstetrizes para o bem-estar das mulheres, tanto antes, quanto durante e depois do parto, é inegável, conforme mostrou o relatório Situação Mundial da Obstetrícia, lançado nesta quarta-feira (5), Dia Internacional das Parteiras. O documento mostra que, globalmente, mais investimentos e apoio em parteiras profissionais poderiam evitar 67% das mortes maternas, 64% das mortes de recém-nascidos e 65% dos casos de bebês natimortos.


A obstetriz Fernanda Vieira de Castro Alves, que atua pelo UNFPA em Roraima, atende pessoas refugiadas e migrantes vindas da Venezuela. © UNFPA Brasil/Pedro Sibahi

Fernanda destaca que “as obstetrizes são profissionais formadas para atender gestações e partos de risco habitual e nossa atuação está relacionada com números mais baixos de intervenções desnecessárias, menor risco de medicalização, desfechos positivos durante parto e nascimento, ou seja, mulheres reconhecendo o momento não como de sofrimento, mas de naturalidade e felicidade”.

No contexto da assistência humanitária, onde a vulnerabilidade e a dificuldade em acessar serviços públicos em um novo país são desafios que se somam na vida das mulheres refugiadas e migrantes, o olhar multidisciplinar das parteiras é fundamental. Elas auxiliam a entender o sistema local e fornecem informações que podem ser totalmente novas para as pessoas assistidas.

“Muitas coisas antecedem o parto e são experiências igualmente importantes”, explica Fernanda. “A mulher precisa se sentir acolhida no pré-natal, entender como funciona a rede de saúde no país, realizar consultas que reconheçam suas experiências anteriores, trabalhar a preparação para o parto”, acrescenta.

Muitas vezes as obstetrizes são associadas apenas ao momento do parto, mas elas atuam em diversas frentes de trabalho, como atividades de formação, dispensação de métodos contraceptivos e atendimentos obstétricos. Conforme relata Fernanda, “fico feliz em fazer parte de diversos momentos de vida das mulheres, seja num exame de citologia de colo uterino, fazendo orientações sobre métodos contraceptivos e de prevenção de Infecções Sexualmente Transmissíveis, seja fazendo a assistência qualificada em situações difícies que exigem empatia e cuidado, como ao atender sobreviventes de violência sexual”.