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Entre os desafios nacionais para alcançar as metas pactuadas na Agenda 2030, no que diz respeito ao exercício dos direitos sexuais e reprodutivos, está a elaboração de políticas voltadas para jovens e adolescentes. Conforme dados apresentados nesta terça-feira (30) pela oficial em saúde sexual e reprodutiva do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Anna Cunha, o Brasil ainda apresenta, por exemplo, alto índice de gravidez na adolescência: uma média de 18,1% de nascimentos oriundos de mães adolescentes, apesar de uma baixa taxa de fecundidade geral. Ao menos 24 mil bebês são de mães com idade entre 10 e 14 anos.

Além disso, o Fundo de População destacou necessidades de avanços na prevenção da violência sexual e das uniões precoces. Conforme o Atlas da Violência de 2018, dos quase 50 mil casos de estupro registrados pelas autoridades policiais no país, 68% foram contra vítimas de 17 anos ou menos. E, de acordo com o Censo de 2010 elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), 88,5 mil meninos e meninas com idade entre 10 e 14 anos estavam em algum tipo de união. “Quando falamos de não deixar ninguém para trás, que é o mote da Agenda 2030, falamos de olhar precisamente para os grupos mais vulneráveis. Precisamos ter políticas que também dialoguem com crianças e adolescentes”, afirmou a especialista do Fundo de População.

O Fundo de População das Nações Unidas apresentou um panorama dos avanços alcançados e da realidade atual dos serviços em  saúde sexual e reprodutiva durante evento em Recife, Pernambuco, defendendo a necessidade de intensificar os esforços para alcançar as metas acordadas. O evento, o “1º Diálogo Público sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, foi organizado pelo Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030 (GT Agenda 2030) e pela ONG Gestos, em parceria com  ActionAid, Associação Brasileira de ONGs (Abong), Associação Municipalista de Pernambuco (Amupe), Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Pernambuco (OAB-PE), entre outros órgãos e entidades. O objetivo era discutir os ODS em suas várias temáticas e os desafios de implementação da agenda no estado.

Anna Cunha ainda ressaltou aspectos como a violência obstétrica e o alto índice de cesarianas realizadas -- o Brasil é o segundo país do mundo com maior média de operações, correspondente a 55.39% dos nascimentos de 2016, sinalizando um possível excesso de intervenções cirúrgicas sem indicação. “A Agenda 2030 é uma agenda muito ambiciosa, os desafios seguem muito grandes. Precisamos acelerar essa resposta, mas isso não vai ser feito sem integração com atores de governo e a sociedade civil, sem diálogo e enfoque na redução de desigualdades”, concluiu. 

 


Evento foi realizado em Recife, Pernambuco. (Divulgação/ONG Gestos)

 

O que é a Agenda 2030?

A Agenda 2030 é uma proposta globalmente pactuada pelas Nações Unidas na busca do desenvolvimento sustentável.  A lista de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que devem ser alcançados até 2030 traz 169 metas e 17 objetivos em si. Entre eles, estão as metas de assegurar o acesso universal aos serviços e insumos de saúde sexual e reprodutiva; de acabar com práticas nocivas contra mulheres e crianças, como o casamento infantil; e o objetivo de reduzir as mortes maternas. Apesar dos avanços alcançados pelo Brasil, entretanto, ainda há muito a ser feito. 

Conforme a especialista do UNFPA, os ODS trazem temas diretamente conectados e em consonância com a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), realizada no Cairo, em 1994, e seu respectivo Programa de Ação, que teve adesão de 179 países. A CIPD representou uma mudança de paradigma no que tange aos assuntos populacionais: até então, havia apenas uma preocupação com a explosão populacional e as discussões eram feitas no sentido de um controle deste crescimento. A partir da conferência, o acesso a métodos contraceptivos e serviços de saúde sexual passaram a ser vistos como direitos reprodutivos, parte do direito humano de escolher quando, com quem e se ter filhos. 

Os dois principais objetivos da Agenda 2030 que versam sobre saúde sexual e reprodutiva são os de número 3 e 5. Mas, conforme destacou Anna Cunha, não é recomendável estudá-los isoladamente. “Temos que ter cuidado de não isolar os objetivos como se eles fossem separados. Dificilmente, por exemplo, você vai alcançar igualdade de gênero se não tiver alcançado progressos na educação, na superação da pobreza e vice-versa. As mulheres que não têm seus direitos reprodutivos respeitados têm sua contribuição econômica comprometida. Está tudo interligado”, explicou.