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Muitos avanços foram alcançados em saúde sexual e reprodutiva desde a Conferência Internacional sobre Desenvolvimento e População (CIPD), nos últimos 25 anos, mas ainda há um longo caminho a ser trilhado. O foco nos direitos humanos, a busca por igualdade de gênero e o acesso universal a serviços públicos devem continuar a nortear as ações de governos e da sociedade civil, concluiu o representante do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) no Brasil, Jaime Nadal, durante debate na Universidade de Brasília (UnB).

Organizada pela Rede Brasileira de População e Desenvolvimento (REBRAPD), a mesa-redonda promoveu debate sobre os desafios da implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e da Agenda 2030 desde a CIPD, que foi realizada no Cairo em 1994. As análises buscaram pavimentar o caminho do que deve ser debatido mais profundamente no Fórum Político de Alto Nível 2019, que será realizado em julho, em Nova Iorque, para avaliar os avanços e obstáculos do desenvolvimento sustentável no mundo.

Em breve explanação feita aos alunos de relações internacionais da universidade e convidados, Jaime Nadal reforçou que a CIPD representou uma mudança paradigmática na forma como os temas de população e desenvolvimento passaram a ser abordados. “A partir desse ano, aspectos que tinham que ficar confinados na esfera do privado, como a reprodução e a sexualidade, passaram a ser elementos sujeitos de política pública. E os estados assumiram uma responsabilidade para promover e implementar esses direitos”, explicou.

Nadal destacou, entretanto, que as mudanças não aconteceram por acaso. Na realidade, foram reflexo de discussões anteriores sobre o poder de decisão de todas e todos. “Foi um processo de longa data que responde a um processo civilizatório. O que estava sendo reconhecido nesta Conferência do Cairo era o direito à escolha: o direito de escolha individual, das mulheres e dos casais sobre se iriam querer ter ou não ter filhos, o número e o espaçamento.” 

Avanços e desafios seguintes

O representante do UNFPA no Brasil avaliou que, 25 anos depois, há muito a ser celebrado. Conforme último Relatório Sobre a Situação da População Mundial publicado pelo Fundo de População das Nações Unidas, a despeito dos desafios, existem avanços visíveis. De forma geral, as mulheres de hoje contam com maior acesso aos insumos em saúde sexual e reprodutiva, especialmente o acesso a anticoncepcionais modernos. As mortes maternas caíram significativamente nas últimas décadas -- no Brasil, foram de 88 a cada 100 mil nascidos vivos, em 1994, para 44 em 2015. 


Jaime Nadal esteve presente (Foto: UNFPA Brasil/Fabiane Guimarães)

Mas o trabalho não está completo e é preciso avançar. O índice de gravidez na adolescência ainda é alto. No país, são 62 meninas grávidas a cada mil, taxa muito maior do que o resto do mundo, que tem uma média de 44 a cada mil. Nadal reforçou a compreensão dos direitos sexuais e reprodutivos como direitos básicos, pilares da busca pelo desenvolvimento sustentável. 

“É também uma pauta que tem a ver com a incorporação de setores que ficaram marginalizados, postergados e discriminados historicamente na sociedade por relações de poder determinadas. E essa é a importância do processo do Cairo, quando a humanidade aceitou que para alcançar o desenvolvimento pleno e sustentável seria necessário  superar essas questões. Estamos falando de mulheres, da população negra, indígena, adolescentes, jovens, pessoas com deficiência, da população LGBTI. Esses grupos precisam ter direitos assegurados, informações, insumos e serviços para que os direitos humanos, inclusive os direitos sexuais e reprodutivos sejam plenamente alcançados”, explicou. 

Desenvolvimento sustentável

O coordenador da REBRAPD, Richarlls Martins, observou que o diálogo sobre como implementar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) se faz necessário. “Entendemos que, para a implementar a Agenda 2030, só vamos conseguir com articulação com parceiros estratégicos, como a sociedade civil e as Nações Unidas”, afirmou.

A Agenda 2030 é uma proposta pactuada pelas Nações Unidas globalmente para alcançar o desenvolvimento sustentável. São 169 metas e 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que estão diretamente conectados com o Programa de Ação adotado por 179 países na CIPD. 

Conforme a pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Enid Rocha, o Brasil tomou para si o compromisso de nacionalizar a Agenda 2030, adaptando as metas para seu próprio contexto. Das 169, 167 foram consideradas adequadas e apresentadas pelo Ipea ao governo federal, para nortear a elaboração de políticas públicas. “Um dos desafios, agora, é a construção de indicadores nacionais capazes de acompanhar o progresso no alcance das metas. Os avanços estão em etapas”, concluiu.

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A Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD) foi realizada no Cairo, em 1994, e representou um marco histórico e uma mudança de paradigma na abordagem global sobre os temas de população e desenvolvimento: se antes os objetivos eram exclusivamente demográficos, após a CIPD o foco se tornou a promoção dos direitos humanos, com ênfase no exercício dos direitos reprodutivos e na autonomia das escolhas individuais. O ano de 2019 marca o 25º aniversário da Conferência, cujo documento foi pactuado por 179 países.