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Acontecimentos que estiveram entre as manchetes dos jornais brasileiros nos últimos dias reacenderam a importância do debate sobre os direitos reprodutivos. Em meio a discursos polarizados, volta ao foco uma proposta, indicada por certos grupos, de que o Estado promova a esterilização de camadas mais pobres da população – uma prática que ignora o direito sobre decidir ter ou não ter filhos. Os direitos sexuais e reprodutivos, base para o desenvolvimento e autonomia da sociedade e dos quais apenas se fala, há décadas são o elefante na sala.

O direito dos pais a decidir livremente sobre a vida reprodutiva foi anunciado pela primeira vez na Conferência de Direitos Humanos em Teerã. Realizada em 13 de maio de 1968, é um marco no planejamento familiar como um direito. Três décadas depois, os direitos reprodutivos foram estabelecidos formalmente e reconhecidos como direitos humanos - em 1994 na Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, no Cairo. 

Os direitos sexuais e reprodutivos estão incluídos em outros acordos internacionais assinados pelo Brasil. No Consenso de Montevideo, eles são citados como essenciais para que sejam alcançados a justiça social e os compromissos nacionais, regionais e globais com os pilares do desenvolvimento sustentável. Nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, são considerados no ODS 3, sobre saúde, e no ODS 5, sobre igualdade de gênero, reconhecendo, assim, a correlação entre a igualdade de gênero, o empoderamento das mulheres e o acesso a informações, insumos e serviços de saúde de qualidade.

Mas ainda há um abismo entre garantir os direitos sexuais e reprodutivos em acordos internacionais e o real exercício destes. Em maio, um estudo publicado pelo Instituto Guttmacher no periódico The Lancet mostrou que as mulheres são as principais vítimas de violações dos direitos sexuais e reprodutivos em todo o mundo. E, em uma lógica de que as desigualdades se alimentam e se reforçam, as pessoas mais prejudicadas são as mulheres nas camadas mais pobres da sociedade.

Entre os dados compilados pelo estudo está o de que, hoje, cerca de 200 milhões de mulheres em países pobres ou em desenvolvimento não têm acesso a métodos contraceptivos. Em números absolutos, esse contingente equivale a quase a população total do Brasil. O resultado, segundo o levantamento, é que 44% de todas as gravidezes no mundo não são intencionais. Ao não terem acesso a métodos, a informações e a serviços, essas milhões de mulheres têm comprometidas suas perspectivas de vida e de um futuro melhor.

Nesse espírito, o Fundo de População das Nações Unidas no Brasil, em uma iniciativa conjunta com empresas privadas, entidades filantrópicas e sociedade civil, lançou em abril a campanha Ela Decide Seu Presente e Seu Futuro. O foco é o empoderamento de jovens e mulheres para que tomem decisões informadas e autônomas sobre sua sexualidade e sua vida reprodutiva. E que consigam encontrar um ambiente favorável e que apoie essas escolhas.

Para que todas as pessoas sejam, de fato, livres e iguais, é fundamental que existam investimentos em ações integradas de saúde sexual e reprodutiva. E, para avançarmos de forma sustentável, é urgente que mulheres tenham garantido o direito a tomar decisões bem informadas sobre seu presente e seu futuro. É preciso falar sobre isso.